sexta-feira, 2 de outubro de 2015

O gato

Todos calados, não ousávamos sequer uma troca de olhares, me sentei onde que não tivesse que compartilhar assento com ninguém, assim como todos os outros, nos sentíamos confortáveis assim, me sentia um pouco incomodada pelo silêncio, mas certamente era mais agradável do que se existissem uma falatória. A atmosfera era tensa, o único barulho que podíamos ouvir era da lataria do ônibus se chocando uma contra a outra enquanto o ônibus seguia pelas ruas imperfeitas.
A medida que o ônibus seguia seu rumo, podia se notar o céu cinza, que de tempos em tempos era clareado por um relâmpago, que rasgava o céu, e iluminava todo o horizonte, eventualmente a chuva veio, mas dessa vez, forte, e impiedosa, se atirava com força contra as vidraças dos ônibus, produzia um som ensurdecedor ao se chocar contra tudo o que cobria a crosta terrestre, podia sentir que as pessoas no ônibus estavam tensas, principalmente eu, tinha medo da mesma, medo da fúria da natureza, na qual é a forma mais antiga e sábia de vida, a chuva os deixou apreensivos, então vi um enorme relâmpago cruzar o céu, no formato de veias, e em seguida veio um trovão, estrondoso, fez com que a terra tremesse, e pude ouvir os gritos de sustos, meus nervos e músculos se contraíram, meu coração bombeava sangue como se fosse o fim do mundo, minha respiração ficou ofegante, eu estava muito assustada, minha parada se aproximava, e a chuva se mantinha, impiedosa contra a humanidade.

Eu havia chegado em meu destino, não possuía nada que pudesse me proteger da chuva além de um jornal velho que encontrei no ônibus, não possuía escolha, o coloquei sobre a cabeça, me preparei e corri em direção à portaria, entrei, fechei a porta atrás de mim, sentia um frio repentino, e pontual, onde as gotas me acertaram, os relâmpagos clareavam o corredor, estava muito escuro, e era pouco mais de 17 horas, apertei o interruptor, e nada, tentei novamente, e nada, ótimo, estávamos sem energia, fui para o elevador, tentei o chamar, idiota, estamos sem energia, em o que eu estava pensando? Deveria subir pelas escadas, me desanimei, tentei me encorajar dizendo que são apenas quatro andares, respirei fundo, levantei meu peito, e comecei a escalda, estava apenas no 2° andar, e já me sentia fatigada, tinha certeza que eram os cigarros, eu realmente deveria parar, ia jogando uma perna na frente da outra, em um movimento robótico, e algo me chamou atenção, era um ruído, não era a chuva, nem os trovões, e a cada degrau ele ficava mais alto, após alguns degraus pude reconhecer, era um miado, cheguei no terceiro andar, e pude ver, com a luz do meu isqueiro, era o gato, pobre gato maltrapilho, deixado pela humanidade, esse era o nome dele, o gato, era o gato de algum morador, ou da região, mas ele sempre estava por lá, acho que ele gostava de mim, ele me viu, e pôs-se a miar, então comecei a me mover em sua direção, e ele ia se movendo também, na direção de alguma porta, a medida que me aproximava, pude reconhecer, era o quarto 302, o gato me olhou, e começou a arranhar a porta do quarto, que se abriu, ele foi entrando no quarto, eu o segui, seria o gato do falecido? 

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